Era uma dor terrivelmente insuportável.
Abri os olhos e mal pude enxergar o que estava acontecendo ao meu lado. Conseguia escutar algumas vozes bem longe, como se quisessem desesperadamente me dizer alguma coisa. Não entendia nada.
Meio desnorteada tentei mexer meu corpo. Sem resultados. Alguma coisa me impulsionava para baixo, forçando meu corpo contra o chão. Meus braços estavam meio largados, mas também sem movimentos. Fui tomada por um desespero permanente. Tentei gritar, porém minha garganta, assim como o resto do meu corpo, não quis cooperar.
Demorei alguns minutos pra poder entender o que estava acontecendo. Sim, eu lembrei o que aconteceu antes que eu desmaiasse. Estávamos brincando muito, rindo, fazendo planos para a próxima viagem e bebendo, bebendo pouco. Inclusive Fábio, o motorista. Lembrei de ter pedido pra que ele andasse mais devagar, ele insistia que podia ter o controle absoluto do carro. Tentamos virar o volante antes que se chocasse contra o muro. Já era tarde.
Não sei por quanto tempo fiquei deitada embaixo das ferragens. Talvez uma eternidade. Algumas pessoas chegavam mais perto e perguntavam se estava tudo bem comigo, pior não poderia estar. Os bombeiros chegaram, mas não conseguiam mover qualquer coisa pra me tirar daquele lugar. Cada vez eu os escutava mais e mais distantes. Aos poucos tudo ficou em silêncio. Enfim acordei. Estava no hospital.
Uma enfermeira arrumava e controlava meus aparelhos. A dor no corpo ainda não havia cessado. Perguntei sobre as outras pessoas que estavam envolvidas no acidente, não obtive resposta. Ela apenas pediu que eu descansasse bem, logo saberia mais detalhes sobre. Tornei a fechar os olhos e dormi.
Meus pais estavam no quarto quando tornei a acordar. Quis saber o que tinha acontecido com todos os meus amigos e como batemos o carro, eles também se negaram a contar. Parecia que escondiam alguma coisa de mim, não sei bem ao certo. Ficavam desconcertados toda vez que perguntava. E eles realmente estavam escondendo. Pouco mais tarde, eles decidiram que era hora para que eu soubesse de tudo. Ninguém que estava no carro resistiu ao acidente.
A dor da perda foi pior do que qualquer dor sentida até aquele momento.
Fiquei naquele hospital por algum tempo. Tive algumas infecções e aos poucos fui enfraquecendo. Sabia que aquele seria meu ultimo dia. Pedi para a enfermeira que chamasse minha mãe que aguardava na sala de espera. Ela chegou no quarto e pude perceber sua profunda tristeza. Suas olheiras e seu rosto inchado não negavam que chorava incansavelmente por dias seguidos.
Ficou comigo até meu ultimo minuto. Às vezes eu a escutava rezando baixinho pedindo pra que eu saísse logo daquele lugar. Suas preces não foram suficientes. Abri os olhos e com todo restante de minha força segurei sua mão e pude dizer que a amava mais que tudo na vida. Ela ficou em silencio por alguns minutos, segurando seu choro. Quando levantou o rosto, olhou fixamente dentro dos meus olhos e apenas me pediu perdão. Meus dias no hospital, e na Terra, estavam chegando ao fim. Foi a ultima coisa que escutei da minha própria mãe. Um pedido de perdão. Fechei os olhos e nunca mais acordei. Queria poder perdoá-la, mas seu pedido foi tarde. Infelizmente tarde demais.
"você diz que quer uma nova chance, agora é tarde demais ..."